quinta-feira, 28 de julho de 2011

Na chama azul do isqueiro amarelo

Minha cabeça dói - pensava enquanto acendia o cigarro na chama azul do isqueiro amarelo. Dedos da mesma cor estampavam o sabor da nicotina entediante sugada ao romper dos anos. A barba por fazer, a mais de três anos, o cabelo esvoaçado e o sentimento de que naquele dia tudo seria igual ao dia anterior, que por sua vez, foi igual ao mesmo dia com o mesmo número de identificação há doze meses. A vida era um ciclo vicioso.

A língua ainda estava dormente, o sacolé enrolado no bolso esquerdo da calça jeans denunciava, que mais uma vez, utilizou daquilo que prometera nunca mais usar. O branco era o mal, o dito pelo não dito. Na última vez que a encontrou jurou, de pé junto, que jamais ousaria a usar aquilo para entorpecê-lo. Mas a cabeça doía, e nada mais poderia ser feito em cumprimento a jura jurada entre lágrimas salgadas do desejo dela ficar. Uma tragada no cigarro, os pulmões em cinza cor da nicotina, os dedos amarelados, o sabor na chama azul do isqueiro amarelo.

O sol clareou no horizonte, aqueceu a mente, o sangue correu mais fácil com o calor na pele. A costa da mão direita suja estava coberta com a névoa horripilante da dor, um cartão de crédito na mão esquerda. Estradas de carrinhos de plásticos bolha são feitas em segundos e em milésimos, destes mesmos segundos, desaparecem.

Merda e a minha cabeça continua a doer – Debruçou sob o joelho e deixou o dia passar.

Árido e pálido

Necessito amplamente,
Abrir meus horizontes,
Doses entorpecentes,
Desejos aflitos,
Negados firmemente,
Entre náuseas e dentes.

Verrugas me saltam aos olhos,
Molho os dedos nas lágrimas,
Desejo o sujeito da frase,
Entrego-me...

Mendigos ácidos,
Negligencio solidão,
Aperto os dedos contra o corpo,
Dedos pálidos áridos,
Noites abertas ao clarão,
Em vinhos de tinto corpo.

Horizontes entorpecentes,
Aflitos áridos pálidos,
Dentes arrancados ao clarão,
Entrego-me...

sexta-feira, 22 de julho de 2011

O reino dos 20 andares

Corria pela escada feito um louco. Subia e descia, descia e subia. Assim eram seus ritos de diversão, naquele verão de 1979. Férias de escola, e na mais lúdica idade, divertia-se com pouca coisa. Aquele espaço era bem diferente do que estava acostumado, nada de terra, nada de água, muito menos do esgoto pútrido que escorria pela rua de casa. Ali, naquele lugar de 20 andares, era somente concreto. Concreto também foi o sonho realizado de ver o mar. Ah!, o mar... Aquela imensidão azul, que até aquele verão só havia visto através da televisão em preto e branco, e era bem mais belo que a figura cinzenta, apresentada através da caixinha que viajava durante as noites na casa do Sô Osvaldo. O cheiro do mar. A cor do mar. O frio do mar.

Uma vez por dia, ele podia ir ali. Passar seus pés na areia branca, sentir as cócegas provocadas pelos finos grãos, sentir o cheiro do mar, encher o pulmão e se entregar a grande maravilha das águas. Com o sol ainda em riste, ele tirava a camisa, descia o calção de brim, largava as sandálias e corria ao encontro ao mar. Pulava a primeira ondinha, se entregava de corpo na segunda e na terceira entregava a alma a Poseidon. Nadava e nadava, seguindo a longa faixa de areia. Acabava-se entre braçadas e pernadas. Pulava onda, furava onda, se enrolava na onda. A água salgada nos olhos, na boca, no corpo. E assim soltava-se, esquecia de todos os infortúnios que havia vivido até hoje na sua longa vida de nove anos. 

Nove anos de lar em lar, acompanhando sua mãe. Em algumas casas era desprezado, em outras nem era notado, e esta indiferença doía mais. Mas ali, naquela casa, naqueles vinte andares, naquele mar... ele era ele.  Sentia-se dono da vida, dono do mundo, dono da mãe, ao menos naquele período, onde ela estava liberada de acompanhar Sô Osvaldo. Este o tratava como filho. Dava balas, brinquedos, carinho, e principalmente, deixava a mãe o acompanhar durante algumas horas do dia. E além de tudo o presenteou com o mar. Ah!, o mar... Depois de certo tempo, ela o chamava, tomava uma ducha fria na barraca de frutas, enxugava-o e iam embora para o reino dos 20 andares.

sexta-feira, 15 de julho de 2011

Em transe...

Em transe, corria pela rua afora, na expectativa de alcançá-la mais uma vez. Todos os corpos lembravam o dela, todas as vidas eram a dela, todas as noites sonhava com ela. Respiros e afagos, na cama do pensamento, faziam com que ficasse mais fissurado no novo reencontro. As noites turvas, os dias gris, o corpo dela num copo de conhaque e o cheiro do ar que ela respirava. Tudo o entorpecia, e a idéia de encontrá-la mais uma vez, talvez a única vez, o deixava assim... em transe.

Nas esquinas imundas e pútridas, ele se aconchegava. Mendigava o encontro, o afago, o doce, a neve branca e sutil dela. Tudo era ela, até mesmo a dor, e disto ele entendia bem, do desencontro maldito causado pela mesma dor, porém que outra provocara, o céu gris da tarde calorosa do outono vivido no inverno. O isqueiro aceso, a cigarrilha soltando fumaça, o ar enfeitado pelo cheiro da erva cubana no ar. O transe...

No quarteirão fechado entre Carijós e Afonso Pena, ele se prostra. Ergue as mãos para o ar e relembra o primeiro encontro, talvez o encontro que nunca existira, e chora... chora um choro chorado de coisas estranhas nervosas. Os joelhos dobram, a gravidade força o encontro maldito do calçamento com o seu rosto débil. Lágrimas salgadas banham a face cansada da procura do encontro. As forças falham, o enjôo chega e a luz vai se definhando... a sensação é reconhecida... o transe.

Um afago a cabeça é sentido. O ar é reconhecido, o molde moldado contra o sol  é perceptível. Não pensou nem uma vez, agarrou-se nos braços longos dela e desapareceu pela Amazonas... em transe.

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Lilás

Depois de cada azul,
Um novo lilás,
Mesmo nu,
Veja a vida voraz.

Depois de tudo blue,
Não vai olhar pra trás,
Mixar dor com alcaçuz,
Chorar... não vás.

Depois de tudo azul,
Não olhe para trás,
Depois de cada blue,
Verá um novo lilás.

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Versos

Em diversos versos,
    me disperso.

Nestes versos, me resto.

Detesto?,
       é certo!

Mas,
   me resto,
         nos versos
                     diversos.