domingo, 25 de novembro de 2012

Ensaio


Porta fechada, tranca trancada, a luz entra pela veneziana e esquenta o piso de madeira. Estalos são jogados ao ar. A fumaça do incenso plaina, o perfume preenche todo o espaço, a cortina, com a figura do comandante, esconde a parte esquerda da janela, permitindo que a luz só entre pela direita. “A esquerda sempre no poder”, pensou e sorriu olhando para o lustre empoeirado. O corpo já reclamava da falta de vida. Olhou as horas e concordou com o habitáculo da alma, já estava na hora de ganhar o mundo e colocar rumo na caminhada.

Café quente na xícara esmaltada. Aroma da casa da mãe. Mãe que não havia mais. Deixou-lhe para trás naquele dia de maio. “Logo maio?”, sempre pensava nisto pela manhã enquanto  fazia seu ritual do amanhecer. Sua lembrança a trazia de volta. Ela podia estar ali, ao lado, sentada no mesmo sofá. Com a TV ligada. Desenhos, quadros, flores, afazeres do dia-a-dia.  Olhos se enchem, coração vazio, desejo de ver tudo pelos ares. São Paulo explodia sua cabeça e milhares de coisas a fazer. E o corpo, continuamente, reclamava da falta de vida.

A rua era tudo que restava-lhe. A Penha lembrava-lhe Teresa. E o corpo, sem cessar, reclamava da falta da vida.


            

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